No passado dia 18 de julho, dia litúrgico da memória de São Bartolomeu dos Mártires, patrono da Unidade Pastoral que humilde e alegremente sirvo, foi-nos permitido reflectir, de forma séria e informal, o tema da morte e do luto à luz da Fé e do Evangelho.
Queria desde já agradecer e louvar a Deus Nosso Senhor a assertividade espiritual e pastoral de D. José Cordeiro; a inesperada relação fraterna, próxima e confiável do Dr. Fernando Seara e do seu impressionante (e perturbante, como sabiamente diz) testemunho existencial; a eloquência bíblica e sapiencial do Prof. José Carvalho, e a serenidade pragmática – quase incomodativa – da Dra. Liseta Gomes que sabe sempre ser mãe e irmã, amiga e confidente diante daquele que sofre e agoniza.
Sob a orientação do Prof. José Monteiro, pudemos todos meditar, pensar e partilhar a morte e a dor que a morte provoca no coração e na vida da pessoa humana, pois “frente à morte às situações desesperadas, esta força – a Fé – ajuda-nos a conseguir um discernimento realista relativamente à vida” (George Augustin, teólogo).
2. Morrer é ser esquecido. Por isso, enquanto alguém lembrar de mim, eu continuo (e continurei) vivo. Na verdade, há gente que morre na vida porque é inútil, é indiferente, é áspero. A morte não é nem nunca poderá ser o fim da existência humana. Não pode mesmo! Pensar e sentir que a morte é um fim em si mesmo é tirar do coração do homem o sonho da imortalidade. Aliás, basta uma leitura rápida – e até vaga – da história da filosofia para percebermos que o homem almeja, constante e infinitamente, a eternidade e a imortalidade. Diria mesmo, está-nos ‘no sangue’.
Belo apercebermo-nos que a promessa bíblica e o mistério da Páscoa da Ressurreição de Jesus não é outra coisa senão a promessa, real e efectiva, da vida eterna como dom dado ao homem.
A cultura dominante, com as suas idiossincrasias, com as suas inarráveis ideologias e com os seus ‘novos normais’, tem criado no homem vazios de sentido e de pertença. É-nos vendido sonhos de sucesso e de ‘boa vida e de vida boa’. Aliás, sonhos esses bem caros… basta ver o quão endividadas estão as nossas famílias. Estes sonhos tornaram-nos, paulatinamente, mais dependente da imagem criada e gerada por esta sociedade cada mais hedonista e narcisista. Somos filhos desta história e destes tempos, mas somos, igualmente, filhos e herdeiros de uma Tradição bíblica, sacramental e eclesial. Filhos amados desde a nossa concepção à nossa morte natural. Fomos e somos projectados a viver a vida de Deus, com Deus e para Deus.
Aos vazios da existência humana, a Igreja Católica continua a ser um baluarte de esperança, um tabernáculo de vida e um depósito inefável de amor.
3. Aceitar a vida como dom é aceitá-la como não pertença pessoal. Ela é dom doado generosamente. Cabe-nos, apenas, cuidá-la e vivê-la em plena oblatividade e partilha. Pois, quanto mais nós nos ‘gastamos’ pelo Outro e pelos outros, mais sentimos e percebemos a missão a que estamos destinados, e melhor compreendemos o lugar que a nossa existência tem na História.
Mais, compreendemos que somos irmãos, filhos do mesmo e único Pai. Isto permite-nos, desde logo, aceitar a nossa fragilidade e a fragilidade dos nossos irmãos. Aliás, capacita-nos a melhor entender a vida como dom doado, amado e desejado. E nesta nobre atitude, damo-nos e dando-nos, transformamos a vida do nosso irmão, fazendo dele um ser único, especial, profundamente amado e desejado.
“Se agora vemos a vida como um dom, Deus aparece-nos em Cristo como aquele que dá. Como o acto de dar faz verdadeiramente parte da natureza de Deus, no fim da nossa vida poderemos encontra-lo como doador” (Ibidem). Pode até parecer idílico (não se entenda como uma ideologia), mas a verdade é que, o largo e vasto testemunho dos Apóstolos, dos Mártires e dos Santos atestam-nos isto mesmo.
Vale a pena viver a vida e vivê-la bem! Vivê-la com Deus no coração e com Deus no horizonte. N’Ele a vida encontra a sua plenitude e o seu fim. “A esperança que atua em nós motiva-nos continuamente para levarmos a vida ao seu cumprimento de forma apaixonada, com serenidade interior, não obstante todos os desafios, as experiências dolorosas, as preocupações e os medos que nos atormentam de forma terrível” (Ibidem).
Saibamos experienciar a vida como dom; saibamos sentir no nosso coração o amor, a confiança e a presença sempre próxima de Deus; saibamos viver em paz e na paz que brota da amizade com Deus. Se você não existisse que falta faria? Quem faz falta a alguém está vivo. É importante porque importamos para dentro, trazemos para dentro de nós.
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